Charles Darwin e o Mercador de Escravos – Parte 2 [Final]

A multidão enfurecida havia agarrado Owen, amarrado num pedaço de madeira como carne recém-caçada e o levaram. O senhor Dibala, dono do hotel nos pediu desculpas pela indelicadeza da multidão e nos contou que a maior parte da ilha seguia uma nova fé chamada Darwinismo Evolucionista. Recentemente as igrejas dessa nova religião haviam se espalhado pelos quatro cantos do arquipélago (que só tinha 3 ilhas habitadas) em diversas congregações cujas duas mais famosas eram a Igreja Ateística da Santa Evolução da Sua Avó e a Congregação dos Santos Seguidores da Seleção Natural. A única razão de não terem unificado sua fé é que, enquanto os fiéis da Igreja Ateística da Santa Evolução da Sua Avó pregavam a inexistência de Deus e a glorificação da natureza, a Congregação dos Santos Seguidores da Seleção Natural pregava a glorificação da natureza e a inexistência de Deus. Os únicos pontos de consenso sob o qual se reuniam em congressos trimestrais eram que Darwin era o único senhor de Galápagos, e a celebração do carnaval, quando se realizava a seleção dos melhores machos e fêmeas para dar segmento à espécie durante as celebrações rituais endossados com verba pública. Faziam parte da celebração ritual a distribuição de cenouras para as mulheres velhas e a repressão da pederastia entre os jovens, os quais eram exorcizados pelo poder da “clava de Thor”, um evento público de grande alegria 3 dias antes do carnaval, quando se arrebanhavam os cidadãos em grupos de 3 com grandes ramos de urtiga com os quais desferiam carinhosas exortações aos jovens pederastas sob forma de golpes cerimoniais em suas nádegas após tê-los obrigado a tomar um laxante famoso na ilha conhecido por “garrafada de quebranto” enquanto um coral de crianças louvava a Darwin em sua sabedoria com o famoso hino nacional da ilha que era mais ou menos assim:

Learntfart! Learntfart! Liberdade, trabalho, amor… (gloc) Hamalai! Hamalai! Hamalai!”

Não lembro bem do resto, o que importa é que pra eles essas palavras faziam algum sentido…

– Esse é, de longe, o lugar mais escroto que o mar pariu em toda sua história! – praguejava Kermit, nosso marujo encarregado de limpar o vômito matutino. Ele também era o cara que subia no mastro pra checar a aproximação da terra. – É o seguinte senhor Dibala, o senhor saberia para que lados levaram Owen?

– Sim, eles o levaram até o rei para julgá-lo! Se querem seu amigo de volta, devo avisá-los que precisam agendar uma audiência, mas é complicado conseguir uma audiência com Darwin todo-poderoso. É necessário preencher um requerimento de 5 páginas da folha de bananeira timbrada real, abrir firma e autenticar no cartório nacional que fica próximo ao grande vulcão, e, por fim, entregá-lo em 3 vias distintas ao faxineiro real que tratará de entregá-las a Darwin, nosso senhor, o qual se encarregará de ler e convocá-los para audiência em data a ser determinada podendo ser revogado o direito a qualquer momento caso o grande rei tenha que empregar as folhas de bananeira timbradas reais para limpar as nádegas após o banquete real fazer efeito… Nos hospedamos no hotel e passamos a trabalhar como guias turísticos durante as romarias daquele trimestre em honra a Darwin, nos quais éramos visitados pelos nativos das ilhas do sul de Galápagos, para pagar a hospedagem fingindo conhecer o local.

– Mas que porra é essa? – dizia Casanova. Quanto tempo mais vamos passar nesse fim de mundo? – Aquieta vagabundo! A gente encontra o capitão na próxima audiência… Ou pelo menos foi o que disse o juiz da 15.ª vara de Galápagos… Ou pelo menos foi isso que eu entendi. Sei lá!

Naquela tarde, a tripulação e eu ficamos inquietos. Nunca passamos tanto tempo em terra e o prazo para entrega do… errr… carregamento poderia nos pôr em apuros. Aquela reunião parecia tudo, menos uma assembléia (e eu sei do que estou falando porque já fui a julgamento umas 5 vezes antes de conseguirem me colocarem nessa enrascada)! O rufar de tambores no cair da noite ao redor de uma fogueira com uma série de indivíduos vestidos com imitações rústicas dos típicos trajes europeus (embora eu deva admitir que marinheiros andavam em farrapos comparados com aqueles não-mais-tão-selvagens). Bailavam e rodopiavam, dançando como borboletas em contraste com as máscaras estranhas e ameaçadoras que usavam, cujas carrancas lembravam feras selvagens recém-saídas do próprio inferno. Havia ainda um cara num trono, ao que tudo indicava, era o rei de Galápagos. Adivinhem de quem se tratava? Outro maldito inglês metido a besta chamado Charles Darwin!! Sim “aquele” Charles Darwin! Mundo pequeno esse… Como ficamos sabendo, ele abandonou sua expedição de estudos, com a qual buscava algum respeito acadêmico na Europa. De fato, estava se tornando bem conhecido. Alguns de seus escritos estavam falando uma meia dúzia de sandices parecidas com as de Spencer e Lamark, mas, por algum motivo, agora as pessoas estavam engolindo. Imprestáveis estúpidos! Eu lhes mostro a mãe de quem descende de um macaco! Merda! Perdi o fio da meada… Ah sim! Darwin havia alcançado as ilhas e permanecido. Apenas seus escritos voltaram e os marinheiros do Beagle davam meias respostas sobre seu paradeiro. Apesar de mortes no mar e interceptação por piratas não serem incomuns, haviam chegado a um consenso que o pesquisador estava morto, ou, na melhor das hipóteses (e era isso que os marinheiros do Beagle justificavam) havia se perdido da tripulação numa das ilhas, podendo ainda estar lá. Poucos acreditavam nisso ouvindo como Charles “boca frouxa” Darwin vomitava como uma mulherzinha! Baita idéia de jerico, é o que eu digo! Trocar a segurança de casa e ir pra Galápagos pesquisar animais esquisitos.  Ele teve sorte de não morrer de peste bubônica, vomitar as tripas pra fora ou ser devorado por um tigre… Se bem que parece não haver tigres por aqui. Mas já vi tanta coisa nesses tempos de navegante que fariam você molhar a cama! …Bem, talvez não tantas, mas já ouvi algumas histórias estranhas dos outros marujos.

– Sejam bem-vindos compatriotas ingleses! – Disse o jovem Darwin. – Ingleses o caramba que eu sou irlandês! Berrou Jimmy, pavio curto, fazendo alguns guardas levantarem as armas.

– Tudo bem homens – disse Darwin. Algumas pessoas de onde venho são um tanto… Litigiosas. Afinal, o que os traz à minha humilde pátria?

Nisso avistei o capitão que imediatamente acenou com um grande cacho de uvas. Estava vestido como um palerma, então imaginei que Darwin o havia tornado o bobo da corte, o que não seria nada mal pra Darwin, o capitão realmente sabia interpretar uma história! O capitão se aproximou do rei e o saudou.

– E aí Charles Darwin! O que que se assucede no pedaço?

– Agora não Owen – disse Darwin.

– Então quer dizer que o grande Darwin bola a teoria da evolução, a seleção natural e o caramba à quatro e veio se tornar deus para um bando de nativos ignorantes?

– Não me entenda mal meu caro, eu não suportava mais aquele maldito balanço de maré de um lado pro outro, dia e noite, cair da cama e reescrever meus textos depois de horas por causa de um maldito solavanco indo pra cima e pra baixo, pra cima e pra baixo e… Bleuueerlgh! Bleuueerlgh! – gritava a multidão imitando o refluxo gástrico do grande mestre!

– Bem… Desculpem por isso, mas prosseguindo senhor… – Aaron. Aaron Maiden.

– Senhor Aaron Maiden… Eu tentei estabelecer contato com essas pessoas e elas se mostraram muito abertas aos ensinamentos da civilização, coisa curiosa porque normalmente eles preferem morrer a mudar seu estilo de vida normalmente, ou pelo menos é isso que se ouve dos que voltam da América. Ensinei-lhes o que pude de nosso idioma e aprendi alguns palavrões entre eles como “tománucú” e “féladaputa”, mas acho que minha maior conquista foi libertá-los de suas fracas noções de divindade.

– Explica pra eles Charles! Gritava Owen montado numa tartaruga enorme tentando equilibrar uma taça de karleesdrink no nariz e impressionar algumas nativas com suas sandices. Parecia estar funcionando.

– O que aconteceu aqui foi uma das maravilhas da antropologia! – Mas você não era biólogo caralho?! – Disse Casanova, com o máximo de sapiência que seu “extenso” vocabulário permitia.

– Ah meus caros, quis dizer que foi um fenômeno notável! Os pequenos pagãos pararam de adorar suas divindades e começaram a adorar a si próprios e a promover um melhoramento racial. A moral mais relaxada favorece melhores cruzamentos e eles não tem uma noção de certo e errado tão estóica – assim como os senhores! Ou pensam que não sei que abominação planejavam com meus súditos?

– Com todo respeito Darwin! Você não é apenas o rei desses nativos. Alguma coisa das suas idéias é idolatrada aqui e, por extensão, você é idolatrado aqui!

– Um homem pode se acostumar com essa vida oras! É bom ser grandioso uma vez na vida… Você chamou meu povo de ignorante meu caro Aaron Maiden, mas o que você diria ser mais prudente: acreditar que a vida evolui da matéria mesmo sem nenhuma evidência de que uma espécie mude em outra distinta com uma grande escala de tempo que ninguém poderia examinar ou acreditar que a vida, o universo e tudo mais são produto de uma inteligência assombrosa que se esconde de nós? – Bolou essa pergunta com um cérebro de macaco Darwin?

– Do’uh! – disse Darwin ao engolir essa. Bem… É… Bleuueerlgh! Bleuueerlgh! – gritava mais uma vez a multidão!

Foi a última vez que discutimos o assunto, já que alguns nativos começaram a pensar se não tinha sido uma burrada acreditar nas palavras de um maluco estrangeiro e torná-lo rei eleito. Mas quando tentavam pensar sobre os deuses chegavam à mesma conclusão, até que veio Barach, o grande, com sua sapiência pregava que o homem foi criado por Skull, o grande alienígena, mas foi acusado e castigado como pederasta no carnaval, apesar de sua inocência, até morrer acidentalmente enforcado numa cruz. Darwin continuaria sendo o rei de Galápagos e todos acatavam suas ordenanças. Inclusive Owen decidira ficar com os nativos, naturalmente polígamos, e favorecer o processo da “seleção natural”. Darwin foi contra já que Owen se tratava de um organismo com o qual aquele ecossistema ainda não sabia lidar. Quando Owen acusou Darwin de estar na mesma condição Darwin resolveu que precisava tomar um porre.

Miraculosamente Casanova quis voltar com a tripulação para evitar pagar a pensão de suas 25 amantes, grávidas em tempo recorde, e que haviam procurado informações sobre esse tipo de processo com o juiz da 15.ª vara, o que foi um tanto ineficiente dado o fato que eram 25 mulheres, se é que vocês me entendem. Não dá pra confiar num sistema legal que tem por símbolo uma galinha preta com os dizeres “corruptis in extremis” em latim. Darwin nos fez pensar sobre o tráfico de escravos e convenceu a tripulação a fugir para o Caribe, mudar o visual e realizar outro tipo de comércio, por exemplo, o de ópio. De fato, se mostrou muito mais humanitário aos olhos da tripulação. Foi aí que eu acordei.

F-I-M!

PEPE! JÁ TIREI A VELA!

As páginas amareladas do livro velho escurecem à medida que a noite se aproxima.

Fecho o livro e olho pela janela de vidro entreaberta.

Entre casas e prédios vejo trechos do céu azul se tornarem em densa escuridão.

Um denso pretume engole os céus.

Fecho o livro, levanto de minha poltrona e caminho pelo corredor tateando até a cozinha.

Aperto o interruptor.

As trevas me envolvem.

Faltou luz.

Charles Darwin e o Mercador de Escravos – Parte 1

Charles Darwin, o Rei! XD

Era mais uma tarde modorrenta no porto de Londres em 1839. Um ponto de encontro de emigrantes, imigrantes, fugitivos, marinheiros, piratas fugidos, arruaceiros e todo tipo de mercadores, desde especiarias a de escravos e prostitutas.

Essa história bem que poderia ter acontecido… se a realidade tivesse algum senso de humor…

Havia um mercador de escravos chamado Owen Stanley, o típico malandro que venderia sua própria mãe se tivesse a chance. Famoso por sua lábia e com uma habilidade incomum de aprender idiomas rapidamente, encontrou seu ganha-pão iludindo nativos por entre os 7 mares com promessas de apresentar-lhes “mundos estranhos e maravilhosos”. Os pobres nativos não haviam aprendido a julgar os estranhos como perigosos. Eram ingênuos e pacíficos demais para tanto… ainda mais por se fascinarem com as palhaçadas de Owen, as invenções do homem branco e – como não conheciam o teatro e o ilusionismo – Owen podia muito bem improvisar uma encenação de “divindade” local… exceto em um incidente em Moçambique em que as palavras “Deus” e “Fezes” tinham uma pronúncia tão próxima que nem mesmo Owen poderia escapar apenas com sua habilidade lingüística. Os floretes tiveram que quebrar o galho…

Também houve aquele incidente com batatas na Índia, mas Owen nunca falava a respeito. Aparentemente foi muito constrangedor.
Precisávamos de uma nova remessa de negros para atender a demanda em alguns engenhos de Café na América do Sul, especialmente no Brasil, mas as coisas estavam ficando difíceis em nosso ramo de negócios. Para facilitar, despachávamos os infelizes nos portos de madrugada em qualquer píer menos movimentado pra não topar com abolicionistas. Aparentemente as coisas vão mudar, mas o comércio de escravos continua. Não leve à mal, não é que não gostássemos daquela pobre gente, mas era isso ou ir pra masmorra.

Owen, eu e a tripulação éramos basicamente desordeiros, ladrões e vigaristas. Também havia o oficial Paul Conondoyle… Um grandessíssimo filho de uma vaca, eventualmente nos escoltando pra garantir que os malandros cumpririam seu acordo com a pátria mãe. “E Deus salve a rainha!” Por que diabos não podiam apenas nos despachar pra Austrália como faziam com todo mundo?! Felizmente ele não nos acompanhou dessa vez. Quanto maior a nossa distância dessa corja melhor.

Ao que parece algumas famílias escravocratas próximas da realeza precisavam de alguém pra fazer seu trabalhinho sujo sem perder seus dobrões de ouro negociando com descendentes de portugueses. Enfim, havia rumores de uma vila habitada num lugar que chamavam de Galápagos. Fomos checar na tentativa de “abastecer os estoques” de escravos. Como Owen era um ótimo ator ficava fácil enganar o pessoal dizendo que os levaríamos para mais um passeio por “terras místicas”. No final das contas as pessoas nos acompanhavam de bom grado e as viagens eram agradáveis… Pelo menos até um ou dois dias antes da chagada quando os acorrentávamos dormindo antes da entrega aos “clientes”. Deus, como eu odiava essa parte! Mas um homem se acostuma a fazer coisas ruins para salvar a própria pele.

No meio do caminho para Galápagos, comendo comida semi-estragada, entorpecidos de temperos e rum, eventualmente alguém tinha que limpar o vômito. Então…

– Terra à vistaaa! – Terra à vistaaa!

– Já não era sem tempo! – disse Owen. Finalmente sairemos dessa maldita barca do inferno!

– Qual é Owen! Você mal pára em pé em terra – disse Jimmy, o primeiro imediato e gigante irlandês.

– Eu que o diga! – zombava Kermit, o cara que limpava o vômito matutino.

– Calaboca Kermit! – disse Jimmy com o carinho típico dos Irlandeses.

– Eu só tenho estômago fraco, oras! – responde Owen – Mais um motivo pra eu querer sair de vez em quando da grande banheira de Deus, ora pois! Nem todos se acostumam com esse maldito balanço. Aliás, vamos aportar a qualquer momento. Mande esse grande monte de vagabundos se aprontar!

– Hail mein Führer!

– O que infernos isso quer dizer?

Ao que parece a avó de Jimmy era alemã e havia lhe ensinado alguma coisa do idioma – único idioma conhecido totalmente ignorado por Owen.

Quase 13 horas depois…


– Um arquipélago! Uma droga de arquipélago! Passamos por duas malditas ilhas que não tinham nada além de tartarugas do tamanho de São Bernardos. Aportar para procurar suprimentos homens! – Bradava o capitão.

– Onde capitão? – disse um dos imediatos.

– Eu é que sei?! Preciso de um porre depois dessa…

O capitão tinha motivos para se irritar, afinal, pelo que dava pra ver de relance deviam ser algumas dúzias de ilhas. De onde estávamos não saberíamos em qual iniciar à procura. Teríamos que descobrir qual delas era habitada. Abastecemos o navio e fomos de ilha em ilha. Dois dias depois finalmente alcançamos nosso objetivo. Uma ilha era habitada!
No entanto, nada nos prepararia para o próximo choque: os nativos eram civilizados! Pela primeira vez em 15 anos uma cultura diferente da que estávamos esperando. As mulheres estarem vestidas a rigor foi, com certeza, a maior decepção da tripulação, especialmente para John Casanova… Maldito pervertido! Como ousa conseguir mais mulheres em nossas viagens que toda a trupe de desdentados, pernas de pau e gigantes irlandeses?! Curiosamente, 3 anos depois ele seria devorado por uma tribo de pigméias amazonas na polinésia francesa. Ouvi dizer que o temperaram no caldeirão com alecrim, lhe quebraram as rótulas do joelho, ainda vivo, e o obrigaram a engolir os próprios bagos – posteriormente retirados de seu intestino e amarrados em colares cerimoniais. O que foi especialmente engraçado quando soubemos porque John odiava alecrim.
Na terceira ilha de Galápagos, a quem os nativos se referiam como “Learntfart Island” (literalmente “ilha onde se aprende a peidar”). Além de crises de riso não compreendidas pelos nativos, para os quais a palavra “fart” significava “grande rei”,  notamos na face norte da ilha o ápice da arquitetura daqueles selvagens recém-civilizados. Eles haviam construído a partir de folhas, pedras e madeira, entre as árvores nativas, um grande HOTEL para turistas, com direito a dança de cabaré regida por uma orquestra de tambores tribais e um chá escuro forte e espumoso apelidado de “karleesdrink” ou algo assim, com gosto próximo ao de cerveja preta.

As visões bizarras ficariam ainda mais bizarras. Nós nos entendíamos a maior parte do tempo. Owen nos explicou que esses nativos haviam mesclado seu dialeto a uma parte do idioma britânico em tempo recorde!
Owen, então, resolve bancar o profeta tentando, como sempre, iludir os nativos. Porém, para eles, a fala de Owen em inglês formal parecia pomposa e efeminada.

– Cidadãos de Learntfart Island! Ouçam-me! Somos enviados dos deuses de além-mar para trazer a vós outros nossa sagrada mensagem! Incumbidos por… Err, Michael Bolton, nosso poderoso senhor supremo de Far Far Away Island (Ilha de tão tão distante) que navega os 7 mares montado em seu portentoso… crocodilo sagrado, convoca a vós outros a serdes arrebatados para uma terra longínqua de delícias. Uma terra onde emana leite e mel! Sim meus caros amigos, somos vossos conservos de além-mar e viemos oferecer a vós outros a salvação!

Quantos de vós virão conosco para a terra prometida?

– Do que diabos ele esta falando? – perguntava uma mulher que deveria ser algo como uma garçonete.

– Blasfêmia! Isso é blasfêmia! – gritava um senhor de meia idade acompanhado de duas prostitutas com os seios desnudos.

A isso seguiu-se um murmúrio que se elevava cada vez mais alto num tipo de oração pausada por sons glotais e um estalido de língua dando a marcação de tempo da reza dos nativos:

“Só a Darwin adorarás! Sê fiel à seleção natural e dar-te-ei os genes da glória! (gloc!)

Só a Darwin servirás! (gloc!)

Ave Maria cheia de massas! O fermento é convosco, (gloc!)

Bendita sois vós entre as confeiteiras! (gloc!)

Abençoado o fruto de vosso forno, (gloc!)

Olhai por nosso bolo de passas recheado agora e na hora de nossa janta, (gloc!)

Lai-lai-lai-lai-lai! Oh hamalai!”

Aparentemente a confeiteira da família de Darwin, uma portuguesa de nome Maria Joaquina, de quem Darwin aprendera seus dotes culinários, era reverenciada pelos nativos que achavam ser ela a mãe de seu rei, logo, a detentora inicial de sua sabedoria e poder. Mas até esse ponto essa havia sido a primeira vez que o nome “Darwin” era mencionado.

– Não pode ser… Seria “aquele” Darwin? – eu pensava comigo mesmo.

Continua >>c